Tiago Madaleno - Trabalho Final
"Capturado, tomava a inapreensível
Forma do furacão ou da fogueira
Ou do tigre de ouro ou da Pantera
Ou de água que na água é invisível."
(Jorge Luís Borges, "Outra versão de Proteu", "Obras Completas", 1999, pág. 109 e 110)
Este trabalho procura pensar sobre a
possibilidade de encarar um documento como uma performance em si mesmo. Pensar
o documento não necessariamente como um elemento de registo ou
antecipação/instrução de uma performance, mas ponderar até que ponto um
documento pode ser encarado por suas potencialidades performativas.
O trabalho prático, influenciado pela
ideia de rumor calculado proposta por Allan Kaprow, procurava tirar partido da
efabulação de algo ocorrido num espaço para alterar a sua perceção e poder
mitificar um acontecimento.
A ideia, que já advêm do último
exercício, consistia em enviar uma imagem por dois lavatórios existentes num
espaço, de maneira que esta construísse um percurso – seguindo as canalizações
até ao mar – que pudesse motivar a viagem. Simultaneamente, um grupo de 49
marinheiros, o número máximo de pessoas que caberia naquele espaço, iriam
conferir solenidade e validade histórica à cerimónia. Esta sobrelotação do
espaço garantia um paradoxo: aquilo que oficializava a cerimónia era também
aquilo que impedia que ela fosse vista pelo público. Desta forma, instituindo
uma “via da desaparição” (Peggy Phelan (1998)) em toda a performance,
aproximando da ideia de Happening proposta por Kaprow, relegando para o rumor,
a especulação, a memória documental, todo o potencial performativo.
Aquilo que começou como sendo um estudo
coreográfico de como se procederia a cerimónia, rapidamente foi crescendo pelo
focar nos gestos, na forma como o corpo se relacionava com o espaço e no
potencial simbólico que emergia dessas situações. Assim, surgiram personagens
(como o trompetista, os lançadores), e situações particulares (micro-histórias)
que iam sendo abordadas, impedindo a concretização do projeto e provocando o
confronto de pressupostos anteriormente tidos como certos. A possibilidade de
haver contradições motivava não só a reformulação, como a garantia de rumor
associada à própria narrativa. O desenho surge aqui explorando a sua dimensão
de potência, de suposição, especulação. O desenho diagramático, ou a utilização
deste como matriz combinatória (recorrendo ao papel vegetal, ou milimétrico), a
pintura, a fotografia, eram pensados segundo uma ideia de ensaio, que procurava manter
possibilidades em aberto, questionar os princípios/expetativas que tais meios
conferiam a quem os toma como documentos. Trata-se principalmente de deixar
possibilidades em aberto – contrariar certezas, apresentar dúvidas, alargar a
fábula.
(Do espaço: organização)
(Lançadores: momento da imagem)
(Trompetista: momento do equilíbrio)
(da pose: continência)
(da comunicação: encaixe e violência)
(vista oficial)