2.5.20

DESENHO, INSTRUÇÃO E PERFORMANCE

Proposta de instrução por Tereza Taf, realizada por Letícia Maia

 Esculpir o Interior



Já de inicio devo dizer, que encarei a instrução de Tereza como um convite para uma experiência, e como tal, alguns aspectos passaram despercebidos, uns foram desobedecidos e outros foram impossibilitados por conta do mal tempo (como o caso de pendurar o tecido na janela para que secasse).
Ao receber a instrução “Esculpir o Interior"passei um tempo refletindo sobre a escolha das palavras, esculpir imediatamente evoca uma ação no tempo e espaço, convida a uma materialidade, ao movimento ao mesmo tempo que situa uma prática artística. A palavra interior, aqui, se relaciona tanto com o corpo que está dentro dos tecidos, quanto com o que associamos de modo metafórico com o caráter mais subjetivo de nós mesmos.
Isso se afirma ao longo da instrução pois Tereza nos propõe "imaginar um útero, um casulo, uma trouxa embrulhada.” aproximando três possibilidades distintas, a gestação/nascimento, o criar casca/metamorfosear e um objeto (trouxa) que carrega algo misterioso em seu interior. Tereza evoca ainda a ideia de vazio palavra que, não por acaso, carrego tatuada no peito e que relaciono com o que é poroso, potente e mutável; o corpo.
Essa instrução necessita da colaboração de alguém para realiza-la, não é apenas um auxilio, mas uma ação em conjunto onde tanto quem amarra quanto quem fica dentro da trouxa estão implicados na ação do inicio ao fim. Convidei meu companheiro para realizá-la comigo, olhamos algo na internet mas achamos que seria mais interessante lidar com as informações da instrução.  
Estendemos os lençóis no chão, me despi e molhei o corpo com água quente, deitei-me no centro do lençol e Ivan começou a amarração. Não me senti em nenhum momento incomodada ou claustrofóbica, pelo contrário, é muito aconchegante estar envolvida pelos tecidos na posição fetal.
Ao longo da ação, confesso que tive bastante resistência em me imaginar renascendo, talvez eu estivesse mais próxima da “(trouxa) que carrega algo misterioso em seu interior” e essa imagem já me pareceu potente por si só. 
Logo no início, me lembrei de quando era criança e minha mãe colocava a toalha sobre minha cabeça para secar os cabelos, das inúmeras vezes que envolvi meus sobrinhos na toalha depois dos primeiros banhos, dos dias insones que passei cuidando do meu pai no hospital, não cabe aqui listar todas as memórias e pensamentos ativados, mas estar envolvida com os tecidos em volta do corpo formando essa “trouxa” me fez pensar muito em cuidado, tanto no cuidado de si como no cuidado com o outro.
Inevitavelmente fui levada a pensar no contexto que estamos vivendo, e de como estamos lidando de forma muito mais próxima com a morte, e por consequência de forma mais crua com a vida. É sem dúvida uma experiência de horror, essa que estamos vivendo, que muitas vezes nos tira a capacidade de narrar, de colocar em linguagem. 
Mais do que uma experiência de renascimento “Esculpir o Interior” me possibilitou uma experiência de cuidado. Diante da incerteza e da angústia do nosso momento, a vida se mostra como matéria efêmera que é.
Estamos feridos individual e coletivamente, precisamos aprender a cuidar para então começar a reimaginar possibilidades do por vir.

Obs: No vídeo, diferente do que foi proposto, grito a frase “NASCI DE NOVO” voltada para dentro do meu quarto, ao refletir um pouco mais e rever o material de registro resolvi deixar o vídeo sem som, sendo que a imagem do meu corpo por trás do tecido propõe um ato de contorno ou desenho silencioso.