13.2.15

Joana Patrão - Trabalho Final




A linha enquanto traço de um movimento ondulatório
Utilização de processos de desenho na manutenção deste movimento.
Capacidade da linha de produzir ondulações em si mesma.



As ondas são vibrações, fronteiras alternantes inscritas no plano da consistência, como tantas abstrações. A máquina abstrata das ondas.
in Guattari e Deleuze, A Thousand Plateaus, 1987, p.252  

Considerando a condição simultânea de impermanência e mecanicidade, propõe-se a análise da onda marítima a partir de dois regimes fundamentais, comuns a qualquer fenómeno, apontados por Didi-Huberman em L'image est le mouvant: “corpuscular (mecânico) e ondulatório (dinâmico)” (Didi-Huberman, 2004:16)

O desenho assume um papel fundamental já que permite uma abordagem analítica e uma consideração da fluidez própria da linha. O movimento ondulatório convoca uma tentativa de sua captação de diferentes tempos - desenhar o fluxo temporal, a linha que ‘escreve o tempo' (Petherbidge, 2011). A investigação apresentada divide-se essencialmente em três momentos (não necessariamente sequenciais, já que estes se vão afectando e sobrepondo): o desenho em tempo real, presencial - que identifica a linha com a onda; o vídeo como modo de estender e parar o tempo captado - análise através do diagrama; a utilização da repetição e do decalque como modo de produzir oscilações que já não se referem às ondas mas são próprias da linha desenhada - permitem manter o fluxo alternante contido no motivo que representam.

1. Desenho em tempo real

Na assumpção de um desenho háptico, produz-se uma identificação da onda com a linha: ambas comportam o ritmo, a alternância, variações estruturais como apresentação de fluidez. Assim os movimentos da mão (visíveis na linha que é traçada) procuram mimetizar o movimento da onda observada. Os desenhos resultantes permitiriam uma  experiência dupla - percorrer o movimento do desenhador será percorrer o movimento das ondas aquando do desenho.
Para além da sua condição de vestígio, a linha que é desenhada é, na visão de Gray, uma linha que se move  (Gray, 1971:9).

2. Análise em tempo diferido

Pretende-se que o método aqui desenvolvido permita que haja continuamente mutações e novos pontos de análise ao invés de estabelecer um modelo estanque. O desejo de estender o tempo, contido no movimento da ondas é o de produzir um ‘confronto com um (...) ponto infinitamente complexo na textura da realidade’ (Rilke, 1919).

Partindo do vídeo ou dos desenhos feitos em tempo real, tenta-se produzir distensões temporais, dissecando variações através do diagrama. Esta análise é assumida posteriormente como pauta ou instrução - capazes de ser lidas enquanto despoletadores de um novo desenho. Encontra-se aqui a possibilidade de gerar a mesma onda indefinidamente - de cumprir contínua repetição da onda através do desenho.

            a. Desenhos a partir das pautas/instruções 

Partindo das codificações feitas anteriormente e assumindo-se ‘a apreensão do movimento, e a sua reencenação’ como fundamentais para a prática do desenho (Ingold, 2007:129), procuraram-se encontrar modos alternativos de reencenar o movimento.

Os desenhos aqui feitos partem de um condicionamento prévio dos momentos do desenho, isto é, o tempo de execução, a direcção, o número de inflexões a produzir e a sua ordem. Apesar destas condicionantes tentou-se que o acaso fizesse parte do desenho numa identificação com a aparente casualidade existente nas ondas. Assim, os desenhos cegos funcionam através do accionamento de uma imagem mental que sobrepõe uma rememoração da experiência da onda com a tentativa de cumprir as condicionantes estabelecidas. A experiência do desenho instruído funciona assim de um modo próximo da experiência do desenho presencial, diferindo contudo no elemento despoletador e no elemento restaurador que os regem. Os desfasamentos do tempo de execução estabelecido e do tempo real de execução são registados.

3. Desenhos da superfície da água
  
O grupo de desenhos que aqui se trata parte da repetição de três modelos computacionais utilizados para simular a superfície do mar apresentados no artigo A Simple Model of Ocean Waves (Alain Fournier e William T. Reeves, 1986). A repetição que aqui se leva a cabo parte desejo de confronto entre as linhas gráficas e o erro resultante da marca das falhas da mão - estas falhas vão sendo mais visíveis à medida que a repetição afasta a imagem do referente inicial, amplificando cada tremor. Este exercício permite produzir ondulações que não são já representações mas resultado de pequenas cedências da mão. 


Com a exploração levada a cabo pretendeu-se perceber diferentes modos de utilizar o desenho como mecanismo capaz de servir como manutenção do movimento ondulatório. 
As duas vias exploratórias apresentadas apoiaram-se, assim, em duas abordagens do desenho, por um lado ‘na ideia do traço corporal autêntico (...) o encontro fenomenológico com o desenho’ (Ed Krčma, 2010:4) e na exploração que se funda na elaboração mais literal de sistemas, signos e processos. 
Pretendeu-se assim considerar diferentes processos como ‘concretizações do tempo’ que o ‘atrasam, condensam e estendem...’. (Michael Newman sobre Tacita Dean in Ed Krčma, 2010:7).
Sobre a experiência aqui explanada é possível reconhecer a procura de uma relação com a experiência Sublime que implica invariavelmente “uma relação transformativa entre ordem e desordem, a ruptura entre as coordenadas de tempo e espaço”. (Morley, 2010:19)




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