Pedro Cunha
I – Acariciar
Derivado da total ausência de
ideias daquilo que deveria realizar decidi iniciar o exercício por colocar uma
folha branca (sendo esta de certo modo a base para qualquer desenho) no tampo
da mesa. Com a folha à minha frente de imediato me apercebi que perante tal
objecto repito constantemente a mesma pequena acção – a acção de passar
consecutivamente a parte de trás da mão pela folha com o intuito de a limpar,
de a alizar, de a sentir, de a proteger, etc. Constatei que este gesto tem um
paralelo formal e conceptual com o gesto de acariciar.
A preocupação pela preservação da limpeza da folha, a preocupação com a sua
protecção contra todas a impurezas que a possam sujar, o cuidado com que,
levemente, são “varridas” da folha as impurezas, criam aqui uma aproximação ao
acto que acariciar – um gesto que
pretende demonstrar carinho, protecção, cuidado, afeição, preocupação por
alguém. Um gesto que geralmente não deixa marcas físicas (que neste exercício
foram tentadas reproduzir), mas que muito certamente deixa marcas profundas em
ambos os intervenientes.
O exercício centrou-se
fundamentalmente no acariciar exaustivamente a folha de papel, acariciar do mesmo
modo que se acaricia um rosto, um animal ou um bem demasiado precioso. Estas “caricias”
eram feitas com as mãos “sujas” de pó de carvão - é curioso realçar a
contradição da sujidade que se ia acumulando na folha com o desejo de limpeza
de onde surgiu a primeira acção.
II – Acariciar/Lavrar
Neste segundo exercício decidi
deslocar a acção de acariciar para um
“suporte”, por assim dizer, que não sofresse tantas marcas com a insistência e
repetição do gesto em questão e que ao mesmo tempo pudesse transportar o verbo acariciar para novas conexões e
significados. A terra (um meio com inúmeras recordações infantis) demonstrou-se
um suporte amplo na qual poderia criar um interessante paralelo entre a acção
de acariciar e muitas outras
relacionadas com este meio.
Iniciei o exercício sem qualquer
ideia de que acção, para além de acariciar, estaria envolvida naquele pequeno
acto de mexer suave e cuidadosamente na terra. Lavrar, ou remexer, ou revolver, ou cultivar, etc foram as acções que me surgiram perante o cenário que
fui mentalmente criando. O gesto de acariciar
pouco tem de semelhante com o de lavrar,
mas quando o primeiro é feito na terra as diferenças parecem-se esfumar e
as duas acções aproximam-se. As marcas produzidas, o cuidado com que são
feitas, a lentidão da sua produção, a recordação infantil, os conceitos de
“mãe” e “mãe-Natureza”, etc - apos ter iniciado o exercício estes paradigmas
começaram a conectar as duas acções.
III – Linear/Marcar/Contornar
Neste terceiro exercício, ao
contrário do que havia ocorrido nos anteriores, comecei já com a ideia concreta
e construída daquilo que pretendia fazer. Com recursos pertencentes ao domínio
da disciplina do Desenho decidi linear/contornar as marcas quem podem ter sido
deixadas no meu corpo pela acções anteriores – acariciar e lavrar.