[1]
Para a primeira proposta
escolhi diversos verbos, mas pontuo os três que trouxeram as
especulações mais interessantes.
cavar
Cavar é em essência o
contato direto com a terra, uma modificação visceral em sua
topografia para diversos fins, quase sempre relacionados ao caráter
transformador desta matéria. Sempre procurei ter meu próprio
jardim e uso muito as mãos para plantar, logo realizei
movimentos similares empurrando a mancha de grafite para criar um
buraco no centro do papel. Foi uma experiência intensa, pois embora
realizando o movimento usual de retirar algo, esse algo em lugar de
sumir tornava-se mais forte, numa configuração diametralmente
oposta ao ato real de cavar.
soprar
O sopro me traspassa
conotações profundas e opostas. Sopramos um machucado em crianças,
sopramos uma vela de aniversário, sopramos poeira e terra em cantos
escondidos. Mas também sopra-se para curar, em rituais xamânicos.
Devido a uma certa influência do verbo anterior, soprei cavando o
desenho. Por um tempo indeterminado, soprei procurando criar um
vazio.
lamber
Em seguida, senti a
vontade de aprofundaram-se nesse diálogo fisiológico com o ato de
desenhar. Decidi-me por mais contato com o material. Em lugar do
sopro onde há a necessidade da distância, o ato de lamber
pressupõe toque. Durante a acção deixe-me levar sem aperceber-me
de nenhuma outro conceito ou conotação que tal atividade poderia
ter ou trazer. Foi apenas fisiologicamente prazeroso. Como
usualmente trabalho com a mente em plena atividade, tendo
consciência a cada traço, essa configuração apresentou-me novas
formas de dialogar com a acção desenhar.
[2]
Comer-Maquiar-se
Para a segunda proposta
reinterpretei duas atividades cotidianas, sendo uma delas uma
necessidade básica e outra um comportamento advindo de valores
culturais. O ato de comer associado ao maquiar-se. Repeti o ato de
passar batom de forma obsessiva na frente do espelho, com um pedaço
de chocolate. Rememorei o prazer que sentia quando criança ao
brincar com uma espécie de chocolate vendido no Brasil chamado
batom. Um lambuzar-se.
A ação foi realizada
num banheiro sem espelhos.
[3]
Num pequeno espaço de
terra, onde cogumelos cresciam, tracei amplos círculos. Usei toda a
possibilidade do meu corpo pois desejava, como resultado, círculos
perfeitos em grande escala. Concentrei-me totalmente nos movimentos
ao ponto de não me aperceber dos pequenos machucados provocados
pelas depressões e pedrinhas do terreno em oposição estática aos
movimentos do meu corpo. Os cogumelos, outra resistência, foram
destruídos durante a breve acção que tornou-se violenta devido a
minha obstinação. Essa acto levantou-me a questão de um possivel caráter
destruidor do desenhar.