12.10.15

Tatiana Móes

    [1]
    Para a primeira proposta escolhi diversos verbos, mas pontuo os três que trouxeram as especulações mais interessantes.
    cavar
    Cavar é em essência o contato direto com a terra, uma modificação visceral em sua topografia para diversos fins, quase sempre relacionados ao caráter transformador desta matéria. Sempre procurei ter meu próprio jardim e uso muito as mãos para plantar, logo realizei movimentos similares empurrando a mancha de grafite para criar um buraco no centro do papel. Foi uma experiência intensa, pois embora realizando o movimento usual de retirar algo, esse algo em lugar de sumir tornava-se mais forte, numa configuração diametralmente oposta ao ato real de cavar.



    soprar
    O sopro me traspassa conotações profundas e opostas. Sopramos um machucado em crianças, sopramos uma vela de aniversário, sopramos poeira e terra em cantos escondidos. Mas também sopra-se para curar, em rituais xamânicos. Devido a uma certa influência do verbo anterior, soprei cavando o desenho. Por um tempo indeterminado, soprei procurando criar um vazio.


    lamber
    Em seguida, senti a vontade de aprofundaram-se nesse diálogo fisiológico com o ato de desenhar. Decidi-me por mais contato com o material. Em lugar do sopro onde há a necessidade da distância, o ato de lamber pressupõe toque. Durante a acção deixe-me levar sem aperceber-me de nenhuma outro conceito ou conotação que tal atividade poderia ter ou trazer. Foi apenas fisiologicamente prazeroso. Como usualmente trabalho com a mente em plena atividade, tendo consciência a cada traço, essa configuração apresentou-me novas formas de dialogar com a acção desenhar.




    [2]
    Comer-Maquiar-se
    Para a segunda proposta reinterpretei duas atividades cotidianas, sendo uma delas uma necessidade básica e outra um comportamento advindo de valores culturais. O ato de comer associado ao maquiar-se. Repeti o ato de passar batom de forma obsessiva na frente do espelho, com um pedaço de chocolate. Rememorei o prazer que sentia quando criança ao brincar com uma espécie de chocolate vendido no Brasil chamado batom. Um lambuzar-se.
    A ação foi realizada num banheiro sem espelhos.

    [3]
    Num pequeno espaço de terra, onde cogumelos cresciam, tracei amplos círculos. Usei toda a possibilidade do meu corpo pois desejava, como resultado, círculos perfeitos em grande escala. Concentrei-me totalmente nos movimentos ao ponto de não me aperceber dos pequenos machucados provocados pelas depressões e pedrinhas do terreno em oposição estática aos movimentos do meu corpo. Os cogumelos, outra resistência, foram destruídos durante a breve acção que tornou-se violenta devido a minha obstinação. Essa acto levantou-me a questão de um possivel caráter destruidor do desenhar.