Para discutir o acto performático e
sua documentação, decidi por realizar uma ação no Museu de Zoologia da
Universidade do Porto. Por motivos de reforma o museu encontra-se
fechado ao público, estando alguns dos animais cobertos com plástico
bolha para protegê-los. Resolvi me cobrir com o mesmo plástico
bolha mimetizando um ser-humano taxidermizado dentro do espaço do
museu. Animais nessa situação de taxidermia, normalmente são
colocados em poses que imitem acções que fariam quando vivos ou “de
pé” para que público possa observar detalhes do seu corpo. Para
mimetizar o primeiro postei-me como se andasse e para o segundo me
coloquei em pé. Permaneci nestas posses por alguns minutos. Foi uma
experiência curta e intensa, pois neste instante, o do acto,
tornei-me eu mesmo parte do museu. Uma peça como outra qualquer que
está lá. Em lugar de transformar o espaço, transformei-me. Não deixo de pensar que, neste instante, a frase “é
pela presença de corpos vivos que a perfomance implica o real”1
ganhou uma nova significação, pois sem visitantes e sem
funcionários no local, os espectadores foram os animais mortos
taxidermizados ou seus esqueletos. Não há memória da acção, a
não ser a minha própria. Se eu resolvesse nunca falar sobre essa
acção ela não existiria. Há aqui o desvanecer do acto. É um
torna-se invisível.
Correndo o risco de destruir uma certa
poesia, escolhi mostrar a um outro público esta experiência,
primeiro como uma evidência do ocorrido, depois como uma procura
poética de laços com outrem. Minha proposta inicial seria
apresentar desenhos da acção como se vista por um espectador vivo,
pois o museu não permite fotos. Mas após a experiência decidi-me
por apresentar minha visão da acção, um desenho de memória feito
após o evento, com todos os “riscos” que acarreta este tipo de
registro. O desenho foi feito no meu diário reforçando uma ideia
metafórica de memória onde apenas tentei procurar transpassar o
imenso silêncio sentido em lugar de uma sinceridade com o “real”, inclusive porque o que desenho é o que acho que vi, pois estava com a vista parcialmente coberta pelo plástico bolha.
“Accuracy is not just a question
of skill it can also be affected by honesty, free will and genuine
mistakes”.2
Bibliografia
AUSLANDER,
Philip (2006). “The Performativity of Performance Documentation”.
PAJ:
a Journal of Performance and Art.
84. Vol 28, September 2006, pp. 1-10.
SCHOLLHAMMER,
Karl Erik (2007). Além
do visível: o olhar da literatura.
Rio de Janeiro: FAPERJ
PHELAN, Peggy, 1998, Dramas, Revista de
comunicação e linguagens, nº24, Lisboa, Edições Cosmos
FARTHING, Stephen, “Recording: and
questions of accuracy” in Writing on drawing. Essays on drawing,
practice and research,
1Phelan,
1998
2Farthing,
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