3.2.17

Desenho e Magia: Confluência

trabalho final

O homem é o único animal que não coincide com o mundo; e o seu destino é dilatar o mundo até onde chega a sua fantasia, até ao céu. O mundo é o céu materializado e condensado, para que as patas dos animais encontrem um ponto de apoio no Infinito (…)                                         
(Pascoaes, 1984,  p.75)

A magia nunca «teve origem», nunca foi construída ou inventada. Toda a magia sempre «foi», desde o começo , um auxiliar essencial de todas as coisas e dos processos de interesse vital para o homem e, no entanto, não deixa de escapar a todos os seus esforços racionais normais. A fórmula, o rito e aquilo que governam é coevo. (Malinowski, 1984, p.78)
A natureza que o desenho mantém como “ritual”, no sentido em que o seu próprio “fazer ” potencia exclusivamente o seu poder, o seu rito, é revista aqui como um acto com conotação mágica. Se tivermos em conta que tanto a magia como o desenho, não são exclusivamente humanos na sua personificação assim como no seu conteúdo, o corpo apenas se torna receptáculo e canal do seu fluxo.
Passo agora a referir-me a “desenho” como “arte da magia”, que à semelhança das outras artes, também esta é regida por princípios que ditam a maneira de dar forma ao acto.
Tendo em conta a ideia de que existem três planos, três níveis, três vias na sua experiência: 
(Guitton, 2000, p.18)
  • Modo corporal, material somático e cósmico
  • Modo físico, exercendo as faculdades mentais como a inteligência, reflexão, memória
  • Segundo o espírito (pneuma), superior, «místico»

Neste acto performativo, exerço uma tentativa de “criar”, harmonizar espaços da minha própria autenticidade, alheando-me do facto de a sua realização se passar num jardim habitacional. Não existe «vergonha», existe um sentimento de estranheza, dentro do próprio corpo. Foi portanto um acaso, pois não se deve ajuizar os alienados, nem atrasar as seus misticismos na hora de sua vontade. A falta de qualidade da imagem é propositada, com o intuito de manter um registo anónimo, «oculto».

O desenho ardeu, literalmente, as cinzas revogaram a sua breve aparência.











Materiais usados: tinta da china, velas, fósforos, alcool etílico, rolo papel craft branco e folhas várias A3
Filmagem executada da janela de um prédio, no 4º andar, em zona residencial.
Video por Miguel Jaques 

Desenhar o que é? Como se lá chega? É o acto de abrir passagem atravéz de uma parede de ferro invisível que parece colocada entre o que sentimos e o que podemos. Como deve atravessar-se tal parede, pois de nada serve bater-lhe forte, tal parede deve ser minada e atravessada com uma lima, lentamente e com paciência, na minha opinião. (Artaud, 1993, p.46)


Referências

  • ·        Artaud, Antonin (1993). O Suicidado da Sociedade. Lisboa: Hiena Editora
  • ·        Centro Internacional das Artes José de Guimarães (2013). Lições de Escuridão. A Oficina
  • ·        Guitton, Jean (2000). Os Misteriosos Poderes da Fé: Diálogo com Jean-Jacques Antier. Lisboa: Âncora Editora
  • ·        Malinowski, Bronislaw (1984). Magia, Ciência e Religião. Lisboa: Edições 70
  • ·        Pascoaes, Teixeira (1984). São Paulo. Lisboa: Assírio & Alvim