Um gesto quase involuntário que me acontece geralmente em um momento de leitura, em que exige certa concentração, onde uma das mãos toca o rosto a procura de alguma inflamação para mexer e não se encerra até saber que "arrebentou" tal inflamação. Neste exercício, foi tomado certa consciência do ato e transferido para o papel no momento de uma leitura, onde por meio de ora um lápis ora a mão tentava-se infringir o mesmo gesto repetitivo e gradativamente intenso, no papel de forma a perfurá-lo em certo momento. Há outro movimento que é feito com as mãos durante períodos de concentração, mais gentil, que é utilizá-las para pentear o cabelo. O ato desenhado não sugere algum apelo estético, mas um momento em que percebo a inquietação provocadas nas minhas mãos em um momento de alta concentração mental.
Ainda com o ato de pentear o cabelo com as mãos, neste momento foi combinado os gestos e movimentos utilizados para pentear (manutenção do corpo) e varrer/limpar algo (manutenção do espaço), ou seja, ações distintas são transformadas em um novo gesto: Empurrar sujeira com a mão com movimentos em que se assemelhavam a alguma demonstração de afeto/carinho, mas que ainda tentava afastar a sujeira. Houve um certo sentimento de estranheza ao realizar este gesto dada a sua descontextualização gerada a partir da soma de outros: Acariciar o chão duro e frio, oposto à natureza do cabelo e varrer sujeira com este mesmo gesto que se revelava desfuncional para tal. Entende-se aqui a importância do contexto em que simples ações se inserem, e que efeitos são provocados ao retirá-lo.
Terceiro momento - "chupar" a paisagem
Durante a graduação em Arquitetura e Urbanismo, chamávamos de "chupar" o ato de transferir um desenho ou imagem de uma superfície para um papel vegetal. Ao se refletir sobre como transferir um ato de desenho para fora do papel, olhei para a janela da sala onde havia cortinas com uma qualidade semelhante do papel vegetal, onde através delas era possível observar o contorno da paisagem urbana. Por isso, este momento buscou transferir o ato de transferir desenhos entre superfícies oara uma cortina que estava cobrindo a paisagem da cidade, ao mesmo tempo em que sua qualidade material a revelava. Os registros são do movimento movimento dos dedos sobre a cortina, numa tentativa de contornar a skyline da paisagem. Transferir o ato de transferência;
As leituras e seminários até então, bem como as atividades deste workshop, me fez refletir sobre a falta de consciência que temos de ações e gestos no nosso cotidiano e principalmente sobre como nosso corpo atua no espaço, muitas vezes quase que involuntariamente. As transferências de uso trouxe esta reflexão à tona nos momentos em que tive que tomar consciência das minhas ações na rotina e explorar dimensões performativas em que os gestos utilizados para executar certas tarefas não faziam sentido.
E isto parece preparar o território conceitual da disciplina que combina atos de desenhar com atos performativos.