“E
descobri que de todos os sentidos o olho era o mais superficial, o ouvido o
mais altivo, o olfacto o mais voluptuoso, o paladar o mais supersticioso e
inconstante, o tacto o mais profundo e filosófico.” (Paterson, 2007, p.1)
"Mapa sensorial"
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Fig.1 "Mapa sensorial" - conjunto de materiais e características a partir das pinturas (Estúdio)
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“A sensação do toque cutâneo quando um objecto roça nossa pele é simultaneamente uma" consciência da materialidade do objecto e uma consciência dos limites espaciais e das sensações do nosso corpo vivido…Como o projecto de Merleau-Ponty em seu Primacy of Perception (1964a) é algo como uma arqueologia da percepção, tentando compreender os mecanismos sociais, culturais e psicológicos as múltiplas formas de tocar.” (Paterson, 2007, p. 2 e 3)
A partir da ideia de fenomenologia ou do fenómeno na imagem
plástica, pensei em fazer uma espécie de um mapa onde constassem as
características fenomenológicas. Num suporte de cartolina comecei a reunir um conjunto
de características e materiais que fazem parte do meu trabalho de pintura. Como
se pode verificar na imagem fig.1, lixas com vários granulados, bocados de
réguas de madeira e MDF, os pigmentos, as cores e tonalidades, o registo das
texturas, das várias tonalidades ao longo dos vários planos, a marca das
ferramentas como espátulas, escovas, trinchas, os efeitos criados pelas
texturas e até o plástico de bolhas usado para proteger os quadros. Chamei-lhe
um “mapa sensorial” porque reúne vários elementos que despertam os vários
sentidos, as mesmas características que procuro que a pintura tenha. Ou seja,
basicamente, este trabalho é uma interpretação das pinturas e permitiu-me
pensar sobre os vários aspectos da imagem plástica.
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Fig.2 Azul índigo s/papel A2 -desenho feito com lixa |
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Fig.3 Azul índigo s/papel A2 -desenho feito com escova |
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Fig.4 Azul índigo s/papel A2 -desenho feito com plástico bolhas |
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Fig.5 Azul índigo s/papel A2 -desenho a partir da impressão |
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Fig.6 Azul índigo s/papel A2 -desenho feito com espátula |
Depois de ter o mapa completo,
continuei a sentir que o trabalho não estava finalizado. Quis interagir com ele. Escolhi um dos pigmentos o azul índigo. E em cada folha, com
movimentos aleatórios, deixava a marca criada por cada uma dessas ferramentas. Fiz
algumas experiências, um desenho apenas com lixa mergulhada na tinta, outro
apenas com uma escova, outro com o plástico de bolhas, outra usei uma das
folhas onde gravei as texturas e por último, outro apenas com uma espátula. Se
antes eu tinha a preocupação de gravar as texturas das pinturas e depois criar outra
paisagem, desta vez, a paisagem surge através das várias marcas que os objectos deixam nas folhas. O
fenomenológico surge nesta relação entre os objectos, os gestos e o registo. Os
desenhos foram feitos em folhas A2. O desenho figura 2, 3 e 6 interessou-me
particularmente, e tive vontade de avançar para um território de maior escala com
o objectivo de a partir da lixa, da escova de cabelo e da espátula criar uma
imagem.

Fig.7 Tela e azul índigo (lixa, escova e espátula)
O que se pode ver nesta imagem fig. 7 é uma
tela onde constam vários gestos, de forma aleatória, e com apenas as três ferramentas, já mencionadas em acima. Um
constrangimento de passar para a tela é que a textura do panejamento cria uma
certa fricção e impede que as ferramentas deslizem como acontece no papel. Neste caso não se trata da materialização de um pensamento, mas da materialização das potencialidades desses mesmos objectos, onde a paisagem
surge através de um entendimento pela abstracção.
Em suma, o “mapa sensorial”
reúne num suporte várias características fenomenológicas para activar os
vários sentidos, com os diferentes desenhos perceber as potencialidades do
registo das ferramentas seleccionadas e, por último com mais ambição, um
suporte de maior escala onde o gesto deixa de ser fluído pelo constrangimento do
suporte em relação às ferramentas, e onde, mais uma vez, a paisagem surge no
entendimento pela abstracção.