12.11.22

retórica do ato performativo

O trabalho da arte é o de jogar com a ambiguidade das semelhanças e a instabilidade das dissemelhanças, de operar uma redisposição local, um reagenciamento singular das imagens circulantes” (Rancière, p. 36)

(frames do exercício performativo e breves transcrições fonéticas)

Marhaba, Ana ismik Inês


Ana uheb al rubz

Janib abi min Angola ua Mesão Frio

Pego na minha garrafa de água. Para mim é um apoio// fisiológico, locutivo e operativo. Arrasto uma cadeira, sento-me. Em português, chamo os meus colegas. A garrafa. A cadeira. Um agente individual perante um coletivo. Um público. Estabelece-se uma relação de orador-audiência. Dou início à minha apresentação, informalmente. A língua falada é o árabe (com algumas gralhas).

Segundo Roland Barthes n’A Retórica da Imagem  (p. 36), a palavra a nível literal responde de forma mais ou menos concreta à pergunta “o que é isto?”. Mas e se passarmos a falar numa outra língua totalmente distinta? Que convenções restam, o que se pode descodificar e que novas percepções são criadas? Neste exercício pretendeu-se o corpo como a norma e simultaneamente como veículo para produção de um desvio (língua falada). São vários os gestos retóricos que possibilitam o desvio neste exercício: adiectio, detractio, inmutatio.

As alotopias criadas partem de diferentes níveis, ressalvando-se aqui as potenciais tensões entre o corpo ocidentalizado e respetivas noções pré-concebidas que temos da língua e cultura árabes. Questiona-se ainda se a estranheza coletiva sentida, se percepcionada como uma experiência partilhada, poderá constituir um novo entendimento isotópico.