22.1.23

Desenho, Instrução e Performance

 

 

 

"Pega num copo com tinta a teu gosto, derrama o copo sobre um papel e desenha o primeiro pensamento que passar pela cabeça . (Partindo da mancha, continua o desenho no mesmo papel)"


A partir da instrução que recebi, segui o que me era pedido, pegando em papel, tinta (de cor azul roxeado) e um copo de água para me ajudar a criar uma mancha. Ao fazer este desenho tentei retirar os pensamentos da minha cabeça e apenas criar aquilo que me viera à cabeça no momento em que deixava cair a tinta aguada sobre o papel. A minha mente pensou no estilhaçar dum vidro em vários pedaços, e então usei a minha mão para espalhar a tinta e pretendi criar o efeito dos pedaços de vidro a separarem, usando a tinta como o espaço entre eles.

Como utilizara papel debaixo do papel central, decidi aproveitá-lo para derramar o resto da tinta e criar um desenho maior nas quatro folhas, desta vez, desenhando flores a partir das manchas que caíram nos papéis.

Optei por gravar o processo para que se visse a evolução da mancha para o desenho, seguindo a instrução que requer em si também uma acção ligada ao desenho.


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Deixei os desenhos secarem durante alguns dias para ver também como estes apareceriam mais tarde e partilho aqui o resultado:





 

 

"Cada um de nós carrega pelo menos um hábito de infância no presente. Usa qualquer meio para demonstrar o teu."


A segunda instrução levou-me a pensar durante mais tempo pois considero que ainda tenho muitos dos hábitos que trago da infância, uns positivos, outros negativos, mas acabei por me decidir num hábito que me é próximo da cultura onde cresci, sendo que o lado da minha mãe é da China e cresci em Macau. Fui habituada a tirar os sapatos ao entrar em casa e este hábito desloca-se comigo seja para que país me encontro.

Para demonstrar o hábito, decidi ainda representá-lo num local fora de casa, duma zona de conforto, e passá-lo para uma zona pública mas onde passava grande parte do meu tempo, fazendo de conta que esse local era a minha casa. Escolhi a Faculdade das Belas Artes da Universidade do Porto para filmar o meu hábito e descalcei-me ao entrar, trocando pelas pantufas no seu interior. Deixando-me ficar confortável dentro do edifício como se estivesse em casa, entretanto deixara as pantufas no decorrer do dia, como ocorre em casa em que deixo as minhas pantufas por todo o lado e acabo por andar descalça ou com meias, até eventualmente sair e voltar a calçar os sapatos.


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Ambas as instruções não me eram obrigatórias, não as encarei como ordens de autoridade mas de convite a criar atos performativos. Foram instruções desafiantes e que, apesar dos atos e obras terem sido resultantes de instruções, não deixam de me pertencer, pois definiria estas obras como pessoais, onde me coloco no ato. A meu ver, a instrução serve como uma espécie de comissão e colaboração com o artista, que em conjunto com o que ofereceu as instruções consegue criar obras de arte. Tal como Sol deWitt refere, os resultados das instruções serão distintas entre aqueles que as executam, pois entendê-las-ia de modo diferente e, portanto, cada resultado seria único.


instruções para outra pessoa


 

 

 

"A partir de uma folha branca e uma caneta preta, desenha um ponto. 
Agora tens a tua mosca. 
Colocando a caneta sobre a mosca, e sem a levantar do papel, guia-a no sentido de procurar a saída para fora do papel, registando o seu movimento por via de linha contínua."


 

 

"Numa folha, escreve aquilo que sentes no momento e, posteriormente dobra e coloca num envelope. 
Demolha o envelope em água até este ficar bem molhado. 
Com cuidado, leva o envelope ao congelador e deixa-o permanecer lá durante a noite. 
No dia seguinte, retira o envelope do congelador e relê o que foi escrito no papel."

 

Por erro próprio, as instruções que passei para outra pessoa foram apenas em formato escrito, pois não me tinha apercebido que elas tinham de ser representadas em desenho, tirando a ideia que parte do desafio estaria na própria interpretação da instrução, até por jogo de letras, daí que tentei não ser demasiado específica para então depois ver como a pessoa executaria as instruções.

Na instrução #1, fui inspirada pelo meu interesse em desenhos de linha contínua e gostaria até que ponto poderia puxar os limites. Criei esta instrução com a visualização que a pessoa simularia o movimento de uma mosca ao movimentar a caneta dentro do papel e questionei se porventura essa pessoa tentasse mesmo sair do papel para libertar a mosca dos limites. Uma metáfora em si pois temos tendência a fecharmo-nos nos nossos próprios limites e para quebrar-nos para novas oportunidades exteriores.

Na criação da instrução #2 já foi mais complexa e decidi até fazer um teste em casa. Quando pensei nesta instrução não foi com o objetivo da pessoa sair bem sucedida, pois tive a falha de não colocar o papel num recipiente antes de o colocar no congelador e o papel acabou por ficar lá preso. Porém pensei que esta instrução pudesse ter resultados variados com interpretações diferentes. A mensagem colocada no congelador são os sentimentos que sentimos no passado que guardamos e muitas vezes esses sentimentos podem ser difíceis de voltar a pegar, voltando para a superfície na altura certa quando sentimos preparados para ultrapassá-los. Uma pessoa que fosse bem sucedida em voltar a abrir a mensagem questionaria se ela sentisse o mesmo ao escrever o papel.