trabalho final
O homem é o único
animal que não coincide com o mundo; e o seu destino é dilatar o mundo até onde
chega a sua fantasia, até ao céu. O mundo é o céu materializado e condensado,
para que as patas dos animais encontrem um ponto de apoio no Infinito (…)
(Pascoaes, 1984, p.75)
A magia nunca «teve origem», nunca foi construída ou
inventada. Toda a magia sempre «foi», desde o começo , um auxiliar essencial de
todas as coisas e dos processos de interesse vital para o homem e, no entanto,
não deixa de escapar a todos os seus esforços racionais normais. A fórmula, o
rito e aquilo que governam é coevo. (Malinowski, 1984, p.78)
A natureza que o desenho mantém como “ritual”, no sentido em
que o seu próprio “fazer ” potencia exclusivamente o seu poder, o seu rito, é
revista aqui como um acto com conotação mágica. Se tivermos em conta que tanto
a magia como o desenho, não são exclusivamente humanos na sua personificação
assim como no seu conteúdo, o corpo apenas se torna receptáculo e canal do seu
fluxo.
Passo agora a referir-me a “desenho” como “arte da magia”,
que à semelhança das outras artes, também esta é regida por princípios que
ditam a maneira de dar forma ao acto.
Tendo em conta a ideia de que existem três planos, três
níveis, três vias na sua experiência:
(Guitton, 2000, p.18)
- Modo corporal, material somático e cósmico
- Modo físico, exercendo as faculdades mentais como a inteligência, reflexão, memória
- Segundo o espírito (pneuma), superior, «místico»
Neste acto performativo, exerço uma tentativa de “criar”, harmonizar
espaços da minha própria autenticidade, alheando-me do facto de a sua realização
se passar num jardim habitacional. Não existe «vergonha», existe um sentimento
de estranheza, dentro do próprio corpo. Foi portanto um acaso, pois não se deve
ajuizar os alienados, nem atrasar as seus misticismos na hora de sua vontade. A
falta de qualidade da imagem é propositada, com o intuito de manter um registo anónimo,
«oculto».
Materiais
usados: tinta da china, velas, fósforos, alcool etílico, rolo papel craft
branco e folhas várias A3
Filmagem
executada da janela de um prédio, no 4º andar, em zona residencial.
Video por Miguel Jaques
Desenhar o que é? Como
se lá chega? É o acto de abrir passagem atravéz de uma parede de ferro
invisível que parece colocada entre o que sentimos e o que podemos. Como deve
atravessar-se tal parede, pois de nada serve bater-lhe forte, tal parede deve
ser minada e atravessada com uma lima, lentamente e com paciência, na minha
opinião. (Artaud, 1993,
p.46)
Referências
- · Artaud, Antonin (1993). O Suicidado da Sociedade. Lisboa: Hiena Editora
- · Centro Internacional das Artes José de Guimarães (2013). Lições de Escuridão. A Oficina
- · Guitton, Jean (2000). Os Misteriosos Poderes da Fé: Diálogo com Jean-Jacques Antier. Lisboa: Âncora Editora
- · Malinowski, Bronislaw (1984). Magia, Ciência e Religião. Lisboa: Edições 70
- · Pascoaes, Teixeira (1984). São Paulo. Lisboa: Assírio & Alvim