Transferência ato-imagem
"Bom, eu tava fazendo o caminho que eu sempre faço indo pra aula, só que já era mais tarde, então as pessoas já estavam fazendo o exercício que foi pedido. E daí fazendo o caminho que eu sempre faço eu reparei a olhar para o lado que a Maira, a Rosa e a Louise, se eu não me engano, estavam de um outro lado, um lado um pouco incomum, que eu não costumo ver ninguém. É mais, sempre o vazio que eu vejo quando eu olho para lá. E daí me chamou a atenção quando eu vi elas três. Eu ainda bati no vidro, acenei querendo mais informações, mas segui para a aula e fui falar com o Paulo. E aí na volta, eu passei por lá, elas ainda estavam lá, e aí falei de novo com elas, acenei de novo para elas e a Maira acenou me chamando, e eu não sabia nem por onde é que entrava. Aí ela foi acenando falando para dar a volta lá por fora. E foi muito legal porque, eu realmente nunca ocupei aquele espaço e eu nunca vi ninguém ocupando aquele espaço, sempre foi um vazio ali e eu não sabia nem por onde ir. Não tinha parado para pensar, como é que talvez eu chegaria ali. E aí quando ela me chamou foi nesse momento que eu tive de parar pra pensar como é que seria. E aí mesmo ela falando que daria a volta por lá. E é engraçado porque você olha assim e você não vê entrada nenhum, você vai chegando até o final, até o final, até o final e você vê do lado esquerdo uma escadinha. Foi muito legal, eu me senti uma exploradora. Foi muito bom essa condução de novos espaços, de novas perspectivas para olhar o espaço habitado né? Não sei, foi bem legal e eu ainda saí, eu não sabia que elas iam fazer isso como trabalho, depois eu soube que elas iam fazer isso como trabalho, que elas estavam ali para o trabalho tal, para fazer atividade do Paulo, mas eu fiquei com essa sensação 'poxa, brigada', conheci mais um espaço, né? Mais um espaço que era desconhecido e eu fiquei com essa sensação assim bem gostosa, de 'que legal!'. Foi isso."
(depoimento de Rava, foi enviado em áudio, mas como não é possível inserir o áudio no blog, foi necessário realizar a transcrição do que foi dito)
(depoimento de Louise)
(depoimento de Rosa)
Geralmente entro no Pavilhão Sul
pelo acesso do jardim da Belas Artes. Passo pela marquise e entro no edifício,
caminho na direção oposta às escadas que vão para os ateliês de gravura e
fotografia, passando pelas esculturas expostas na alta estante de madeira.
Desço um ligeiro lance de escadas e cruzo o corredor em frente a uma das salas
de desenho; à minha direita, a parede feita de janelas separa o corredor do vão
central do prédio, onde se encontra uma grande escultura amarela de quem
desconheço a autoria. Parece que está lá para preencher o vão, ocupar o espaço
que sem ela, talvez continuasse vazio.
Dos
dias que já passei por aquele corredor, nunca vi nada ocupar aquele espaço além
da solitária escultura, tão pouco sabia como acessá-lo. Sendo assim, decidi
explorar tal ambiente afim de ocupa-lo por algum tempo. Claro que faze-lo
sozinha poderia gerar certo estranhamento tanto a mim quanto aos transeuntes
que assim como eu, passam por aquele mesmo corredor esperando ver apenas a
escultura amarela, contudo parecia não fazer sentido estar ali sozinha, a
ocupar o espaço quase como uma outra escultura, ainda continuaria vazio, pois
não estaria efetivamente sendo utilizado com um propósito.
Convidei
algumas amigas para se juntarem ao meu singelo experimento. Descobri que chegar
até o local era mais simples que esperava, sendo apenas preciso atravessar a
lateral direita do prédio (do ponto de vista de quem chega pelo jardim) e
encontrar uma escada que da acesso ao vão. Nesta parte do trajeto, é possível
observar a rua e uma pequena praça.
O
espaço parece abandonado, inclusive a escultura amarela, que agora vista de
perto possui um ar de negligência abrigando montes de folhas, penas e lixo por
baixo de suas largas barras de metal, detalhe que não é possível perceber ao
olhar para ela das janelas do corredor.
Ocupamos
o espaço por um tempo e conversamos sobre o mesmo e como era estar ali. Apesar
de isolado é um sítio exposto, rodeado de janelas onde todos que passam podem
assistir ao que acontece dentro do vão. Algumas pessoas olham rapidamente pelo
corredor. Tento manter contato visual com elas enquanto passam, mas desviam o
olhar ao serem confrontadas com o meu. Apenas um rapaz sustenta o olhar no meu
durante todo o percurso.
Uma
de minhas convidadas vai explorar o espaço enquanto converso com a outra,
depois ambas vão para outro canto do vão aproveitar o espaço de outro modo.
Vejo outra amiga pela janela do corredor e a convido a se juntar a nós. Ela
vem. Por fim ficamos as quatro ali conversando, pensando quais outras
potencialidades aquele espaço teria e como poderia ser aproveitado com mais
frequência e possíveis motivos pelos quais ele não é tão utilizado.
Depois
seguimos de volta a aula. Ainda não tenho certeza se o que aconteceu tem alguma
relação com arte, apesar de achar que a ação tange uma certa performatividade. Tão
pouco pensei em uma solução estética para o trabalho, não quis fotografar nem
desenhar o que estava a acontecer ali. Como documento, ou sugestão, quem sabe
outro convite, uma única fotografia do espaço vazio, pois é assim que o
encontramos.
A
potência a ser explorada é o vazio, é este elemento que me inquieta, mostrar
algo diferente disso drenaria o sentido do que aconteceu, resumiria a
experiência em uma representação sem significado. Não quero exibir nenhuma
prova do que foi e sim daquilo que ficou, da experiência gerada, em mim e em
minhas colegas. Um agradecimento especial a Rosa, Louise e Rava