A acção consistiu na preparação de um almoço no átrio do
pavilhão sul, lugar de circulação para as salas, para as máquinas de café e
snacks e acesso à máquina fotocopiadora. A ementa foi elaborada para quatro pessoas e consistiu num arroz de frango, salada, pão, vinho tinto, fruta e café.
Arquivo/documento da
ação executada:
Talões de super mercado
Preparação e almoço
Ângulo morto nas filmagens
(talvez devesse ter aberto espaço para um rumor calculado)
Os vestígios do almoço na toalha
Tudo isto é real, tudo o que está representado nas imagens
aconteceu de facto.
A performance é realmente um momento único e irrepetível e a
sua documentação em pouco se compara com o momento performativo. Enquanto registo
parcial do acontecimento acaba por tornar-se tendencioso, não passando de uma
referência. Apesar de concordar com as noções apresentadas por Peggy Phelan
sobre as necessidades de desaparição próprias da performance, sei que
representa algo contra a minha natureza, sou uma pessoa que se alimenta
vivamente de imagens, procurando lembrar-me das coisas, mesmo que a recordação
se encontre alterada. Compreendo que os documentos deslocam a memória, mas a
memória é isso mesmo, um acrescento de deslocamentos. Não quero que as coisas
caiam no esquecimento, é doloroso.
Nessa medida, o ato foi propositadamente pensado em função
da realização da própria documentação. Da ação resultaram 2 talões de super-mercado,
195 fotografias, e aproximadamente 3 horas de filme repartidas entre duas
máquinas de filmar. Entre as duas máquinas de filmar existia um ângulo morto que
eu utilizava para ir buscar os alimentos sem ser registada.
Toda a documentação é insuficiente, nunca será possível sentir
o cheiro do refugado, ou saber de que assuntos falaram ao longo do almoço. Diz-se
por ai que o frango estava bom, mas também não sei, não comi.
“Ver o documento não como representação de
segunda ordem, mas como o espaço de um
novo acontecimento –
seja o da fotografia, vídeo, palavra escrita, diagrama, ilustração, etc.”
(Paulo Almeida, 2018)
Agradecimentos: Beatriz Bizarro, Beatriz, João Pinto, Gil
Raro