(1) Ação realizada por Mariana
Barrote a partir de uma Carta de Instrução
Pedra
Desenha uma
pedra com o teu peso.
Tenta pegar
nela.
Se
conseguires,
transporta-a
até ao último andar de um edifício.
Não uses o
elevador.
Dirige-te a
uma janela ou algo semelhante e verifica
que ninguém
se encontra a passar lá em baixo.
Atira a pedra.
Quanto
tempo demora a mesma a chegar ao chão?
Partiu-se?
Foi dado à Mariana uma caixa onde contém uma série de referências
e informações relativas à trajetória do asteroide Sísifo, desde imagens, dados e
rota do mesmo, até desenhos de uma simples pedra. Estas imagens teriam a função
não só de contextualizar a instrução, como também de criar uma série de estímulos
e até mesmo pistas para guiar a pessoa que iria realizar a instrução. A
realização da mesma torna-se em algo quase absurdo, ambíguo e ilógico de se
realizar. Ela premeia o pensamento e imaginação do atuante, dá espaço para uma
aparente liberdade onde várias interpretações e resultados podem surgir da sua
leitura. Como se desenha uma pedra com o próprio peso de uma pessoa? O peso dessa
pessoa terá que ficar registado numa folha de papel? A folha de papel terá que
representar o corpo do atuante? Como? Como
transportar um desenho que contém o próprio peso do atuante? Como atirar um
desenho de uma pedra? Várias questões surgem com as poucas palavras que contêm
a instrução e o atuante terá que tomar uma rota por onde a ação irá se
desenrolar.
A Mariana tomou uma abordagem bastante peculiar e acabou por
subverter as minhas expetativas. Numa folha de tamanho não maior que o A5 ela procede
em dirigir-se ao passeio do jardim da faculdade, onde se encontra um rosto na calçada
e a realiza uma frottage a carvão. Coloca-se várias questões pertinentes
com esta ação inicial. Ela projetou o seu eu, o seu peso através do rosto da calçada?
O Rosto humano que se encontra na pedra torna-se numa projeção, num veículo que
permite a atuante rever-se na folha de papel marcada com o carvão? A própria escolha do material torna-se bastante
interessante, visto que o carvão é um meio abrasivo bastante volátil e que
permite muito facilmente a sua limpeza e apagamento. Numa segunda fase ela
procede em amassar a folha de papel, escondendo o desenho e ganhando uma forma
que se assemelha a uma pedra. De seguida, o papel amassado é atirado das casas
de banho do edifício de Escultura, contando o tempo que o mesmo demora a cair
ao chão. A pedra não se partiu. A instrução acaba quando a Mariana recolhe o
papel e coloca-o dentro da caixa com as anotações tiradas. A caixa torna-se
assim no elemento que dá a instrução, como também dá a apresentar o resultado da mesma.



(1) O Não-Objeto ou pintar uma cadeira de branco
(instrução para Mariana Barrote)




(2) Ação realizada a
partir de instruções de Mariana Barrote
desenhar problema que
se quer resolver; escolher um local escondido; focar a mente nesse problema e
aguardar que passem duas pessoas a conversar; ficar atento ao que dizem pois
será a resposta à pergunta; registar; desenhar do lado oposto da folha; guardar os desenhos escondidos da vista dos
outros.
É numa simples folha A4 dobrada que se encontra um pequeno
desenho e a instrução a ser realizada. Interpreto a instrução como uma espécie de
jogo onde a ideia da ocultação do meu corpo (como se tratasse do jogo das
escondidas) cruza-se com a concentração mental que a instrução exige. Mas
primeiro é necessário encontrar um problema e desenhá-lo na folha de papel.
Este desenho, também ele é oculto, secreto, fora dos olhos da pessoa que escreveu
a instrução. Existe um espaço para o íntimo, para o desenho que não se revela e
não entra na esfera pública. Só eu tenho acesso a este desenho e ao seu conteúdo.
Estando eu vestido com cores terrosas e esverdeadas posiciono-me entre as
plantações e vegetações do jardim da faculdade, conseguindo ficar isolado e quase invisível ao olho nu. Existe uma
invasão da privacidade, de tentar ouvir e escutar as conversas de outros na
esperança que as primeiras palavras que ouço se tornem na solução para o meu suposto
problema. Sou quase forçado a entrar num estado absoluto de concentração para
tentar ouvir as conversas e pessoas que passam ao longe. Por fim, escuto a
solução pretendida, sem saber de onde veio nem que pessoa a proferiu. Registo-a
no verso da folha e escondo-a e procedo a enterrá-la no mesmo jardim da faculdade, no local
onde realizei uma ação no primeiro workshop, onde enterrei os meus pés e
reguei-os com água. Ninguém a pode ver. Permanece oculta, escondida e fora do alcance
dos outros.
Desenho como
instrução (semana de 29 de abril a 3 de maio)
Foi cedido à Mariana um conjunto de desenhos de instrução
que consistiam na inutilização de um objeto através da ação de o pintar(apagar?)
de branco. A atuante estaria sentada numa cadeira e procederia ao ato de pintar
a mesma até que a cadeira/objeto perdesse a sua função e a pessoa fosse
obrigada a sair do seu lugar. A tinta branca e fresca não permitiria uma pessoa
se sentar e com esta ação surge um resultado ambíguo e absurdo onde a
pessoa vai perdendo o seu próprio espaço pessoal. A cadeira perde a sua presença.
Foi apagada? Espaço vazio? Não-objeto? Ou até mesmo uma obra artística? São questões
que podem surgir na realização desta ação e que pretendem instigar e estimular
o pensamento do atuante. A Mariana surpreendeu-me com o seu resultado, achando bastante
estimulante e pertinente a sua interpretação da instrução. A documentação ganha
um lugar privilegiado na resposta da Mariana, ela trabalha-a para que a
ação seja transportada para o espaço documental sem a mesma nunca ter sido
realizada fisicamente. A partir da encenação, teatralização e simulação do ato
de pintar a cadeira e o seu respetivo registo fotográfico, a Mariana efetua através
de programas de computador a adulteração da imagem. A partir de linhas brancas simples
e rudes, ela simula a pintura da cadeira sobre a fotografia a preto e branco. A
ação foi realizada? Esta pergunta torna-se irrelevante neste contexto. O
espetador sabe que as linhas brancas foram realizadas pó-registo, no entanto, a
documentação torna-se no veículo onde a ação se corporiza e se afirma. Não se
tenta esconder essa adulteração, ela faz parte de um jogo irónico que se
estabelece entre a instrução, a ação e a sua documentação. Encontra-se aqui uma série de pontos em comum com o texto de Auslander acerca das várias
possibilidades performativas que podem ser abordadas na própria documentação de
um ato performativo. A Mariana reage à minha instrução através da negação, porém, ela mantém-se fiel às ideias bases que a regem.


(2) Mensagens captadoras de memória
No dia 26 de maio, com a folha de instrução
foi-me dado um pequeno papel rasgado com o número da Mariana. Nada mais dizia
nesse pequeno pedaço de papel. Este fez-me lembrar a ação típica do quotidiano,
de apontar o número de alguém em algum caderno ou folha de papel e desseguida
rasgar e guardar no bolso, ou na carteira.
Durante a próxima semana iria receber
chamadas ou neste caso mensagens com ordens/instruções para criar uma série de
desenhos no momento da leitura dessas mesmas instruções. Realizar esta ação
obrigar-me-ia a estar sempre com materiais de desenho, isto é, se eu a seguisse
à risca. Achei curioso a possível relação que se poderia obter com a realização
aparentemente fiel das instruções enviadas pela Mariana, quase como se tratasse
de algo autoritário que me obrigaria a estar constantemente atento ao telemóvel,
à espera que algo fosse acontecer, que eu fosse receber as ordens esperadas de
forma quase obediente.
As instruções abordavam questões associadas
ao íntimo e à memória, onde o desenho torna-se no veículo para transpor objetos
e ações do quotidiano como a almofada, as mãos o próprio escuro do quarto ou o desenhar pessoas, ou objetos que me são próximos. O corpo de trabalho pode ser divido em
dois, os desenhos que seguiam à risca a instrução que me era enviada,
registando direta e fielmente o que me era pedido, de uma forma quase submissa ou desenhos que resultam
de um jogo com as palavras, subvertendo
a instrução que me era dada e criando desenhos ambíguos e codificados.
O resultado é uma mancha visual de 13
desenhos/13 instruções realizadas a partir de diferentes suportes e técnicas que
expõem uma espécie de autorrepresentação que se assenta na memória.