15.12.16

Ocupar o espaço com memórias 



Pergunto a mim mesmo se uma recordação é algo que se tem ou algo que se perdeu. - Woody Allen, guião de Uma Outra Mulher  
Podemos alterar, lenta, paciente e perseverantemente, dados, pequenos pormenores, matizes de aparência insignificante, moldando a recordação do sucedido aos nossos sentimentos, alheios à verdade ou à razão, para conseguir, no final, que aquilo a ficar registado na memória corresponda a uma versão satisfatória, falsa ou totalmente verdadeira mas ajustada aos nossos desejos (....) Podemos também, por iniciativa própria ou induzidos por outros, criar memórias falsas que, passado algum tempo, se torna indistinguíveis das verdadeiras e resistirão incólumes a qualquer tentativa de serem desmascaradas.  - Miguelanxo Prado, Ardalén 


Modificar, perder, criar a falácias... 

   Inicialmente propôs-me a procurar informações sobre a minha casa, descobri as suas metamorfoses, os diversos planos, e observei que no final ela encontra-se diferente ao planeado, pura falácia, ou fonte para criação de algo novo. Assim o conjunto de documentos, recolhidos apresentou-se com um exemplo para refletir sobre a tentativa de transpor um acto performativo para um objecto posterior, apesar no papel ser apresentado um esquema preciso ele foi alterado por quem o interpretou depois, e a realização do objecto, neste caso uma casa, não segue fielmente o documentado, a exteriorização da informação é modificada conforme o tempo, o espaço, e a pessoa que o realiza ou simplesmente observa (espectador - Auslander). 


   Documento não é uma a cópia do realizado, é um elemento importante para manutenção visível das transições das possíveis acções e pensamentos, uma ferramenta que permite dar a ver algum do passado, deste modo o documento não é regra, um plano a seguir criteriosamente.  
Interpretar. Modificar. Levou-me a divagar pelo verbo transportar:  


verbo transitivo

1. Levar de um lugar para outro.

2. Fazer passar de um para outro lugar.

3. Passar a outrem por cedência.

4. Mudarinverter.

 in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008 2013, https://www.priberam.pt/dlpo/transportar [consultado em 15-12-2016].

     Como seres de passagem, somos eternos recoletores de tudo o que nos aparecer à frente dos nossos corpos, mas não mantemos esses elemento no seu estado inicial, as acções que aplicamos nos elementos alteram-no, e quando o movimentamos ou aproximamos de outros elementos criam-se novas relações. 

     Perante o espaço, a minha casa, e os seus elementos tentei pensar sobre o que eles me levavam a fazer: as telhas e a lenha cortada que deveriam ser empilhadas, as folhas do milho que deveriam de ser arrancadas. Mas essas tarefas com a sua regular realização, interiorização do movimento, ou por um tremenda curiosidade, permitiam por vezes desligar dos movimentos e dar atenção a propriedade do material, como por exemplo a textura, o peso e a cor.
  
Modificar o que nunca vai existir 





Lembrar, sentir


Madeira, o peso do corpo

Cortar o milho, sentir as folhas e o movimento da tesoura. 

Impressão da textura, o papel a tatear a folha do milho
  
Tons das telhas

Vídeo sobre a realização manual de uma telha - https://youtu.be/fLCp7Ng7zs0
Transformação num quadrado 



Levar o que é "meu" 

    No transporte de Vilar de Mouros para o Porto, dos objectos, actos, memórias de um lar, tornei algo estranho um pouco mais familiar, ao invadir o espaço com algo que é "meu".  
   Desde o inicio da minha vinda para o Porto, a procura de espaços verdes era uma tentativa de me transportar para a proteção, e aconchego de casa. Deste modo, o jardim da Faculdade é um local com o qual criei uma empatia, e nesta proposta tentei ve-lo não como elemento que me liga a outro local mentalmente, mas sim como um recipiente do que possuo, mudar a minha relação com esse espaço, impor a minha presença, ser a autoridade de mudança violenta, e brincar com o "fogo".  
    Levar uma telha, pedaços de madeira, futuramente objectos de palha... objectos resultados de um trabalho manual, de contacto com elementos naturais, para a construção de um lar, e que perante o ensinamento do conto dos três porquinhos,  é melhor construir casa de tijolos - telhas,  apesar de ser mais trabalhoso a sua construção, ficamos protegidos do lobo mau.   
    Contra o abandono dos objectos, estes não foram simplesmente colocados no chão, eles encontram-se no interior de um quadrado... linhas que fazem um quadrado, limpo de folhagens, onde marco o meu territorio, como um animal (i)racional, o meu espaço naquele jardim que poucos sabem os seus recantos. 

Espaço, movimento e presença
 


     Ir e ficar


Vídeo sobre limpar o espaço - https://youtu.be/wF49zaOlaIU




Vídeo sobre limitar o espaço - https://youtu.be/Zkj9s1IXLFs - https://youtu.be/mr92JWr4jeU







Vídeo sobre o tornar "meu" - https://youtu.be/-q4PT9Ifyco