3.2.17

Trabalho final - O poder da retórica na eficácia das imagens

Em resposta ao trabalho final da disciplina Processos Retóricos e Performativos desenvolvi uma proposta experimental, com base no que foi ensaiado nos seminários, que explora a percepção da temporalidade e jogos fictícios com o tempo.
Para desenvolver este ensaio parti de uma cena animada na qual cresce de um corpo sem cabeça uma planta no lugar desta; cena presente na animação O gato Galvatchi criada em atelier. Foi por aí que se começou a relacionar o projecto de atelier com este ensaio prático, não tendo apenas ficado por ai.
A própria imagem criada, tanto na animação como no ensaio, implica um desvio, transmutatio, que se verifica na troca da cabeça pela planta. Este é uma metáfora visual que representa a inspiração que eu tenho por parte da natureza.
A partir do momento em que a planta cresce o corpo é visto como objecto, um vaso, que gera e alimenta uma nova vida.
Considero que o trabalho desenvolvido para atelier, também, se trata de um desvio. O que vemos não é o movimento real mas sim uma ilusão que é criada pela sequência de imagens/frames; isto acontece devido ao olho humano levar fracções de segundo para esquecer uma imagem. Quando projectadas imagens a um ritmo superior de dezasseis por segundo dá-se a ilusão que imagens estáticas se estão a mover.
Pelos motivos aqui explicados fez-me perfeito sentido esta ponte entre o meu projecto de atelier e este ensaio, conseguindo desta forma uma analise diferente, da que realizada, da minha animação.
A retórica da minha animação realiza-se no meio de cenas, estas representam na sua maioria convenções da realidade, à excepção da tratada neste ensaio, essa transforma-se em signos e símbolos, que ilustram uma metáfora; vejamos «de que forma a linguagem cinematográfica intensifica o poder de comunicação das imagens poéticas (...) explorando as imagens como metáforas e símbolos; evitando, com suas recorrências e voltas, o fluxo temporal direto; colocando-nos diante de um mundo mítico e atemporal(...).» Gottardi (p.21/22). 
A metáfora criada recorreu à técnica joiner photography; através de várias fotografias com exposições diferentes obtive a imagem na totalidade juntando-as digitalmente. Alguns artistas que usam esta técnica tentam esconder ao máximo o sítio onde a junção se sucede, já eu pretendi acentuar. Desta forma consegue-se ver que a imagem foi formada por outras setenta e seis.
O corpo retrado na imagem é o meu, não me fazia sentido usar outro visto que a metáfora representa algo meu, e a planta é uma sansevieria que tenho em casa, esta destaca-se pela sua rusticidade e resistência. Para que conseguisse desenhar o movimento do meu próprio corpo fiz uma impressão deste, o mais perto que consegui do tamanho real.
No cinema a cadência de projecção padrão é desde 1929, 24 fps (frames por segundo), ou seja, por segundo são necessárias 24 imagens para termos a alusão de movimento. Como a metáfora é criada por setenta e seis imagens percebemos que levou apenas três segundos o corpo e a planta a aparecer. Surge assim uma relação com a ideia da temporalidade.
Ricoeur defende que o feito de desvios ocorrem em diversos pontos de vista sobre os acontecimentos: há o tempo do acontecimento, o tempo que narra o acontecimento e o tempo que o espectador reconstrói na relação entre o acontecimento e a narrativa. Gravei a minha voz a dizer: "cresce de um corpo sem cabeça uma planta no lugar desta" para perceber quanto tempo demorava a narrar o acontecimento e é por isso que a imagem criada demorou três segundos.
Registei, por cima da fotografia, todos os movimentos que foram necessários para a realização da acção, dentro do tempo que esta decorreu.  À medida que ia desenhando os movimentos percebi que a temporalidade, também, é marcada pelo desgaste do marcador.
Do ensaio que fiz retiro o poder e a capacidade que o desenho tem como acto metafórico. Como este pode substituir coisas e criar imagens que gostaríamos de mostrar mas que de outra forma não era possível. O ensaio que fiz não só cria a acção como a documenta.




Fig.1 a 7 - registos fotográficos, obtidos durante a realização do ensaio, 2016